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Tem PANC no prato: restaurantes de SP colocam plantas diferentes no menu

Frango guisado com tempura de caruru, do Balaio IMS - Carol Gherardi / Divulgação
Frango guisado com tempura de caruru, do Balaio IMS Imagem: Carol Gherardi / Divulgação

Cíntia Marcucci

Colaboração para o Urban Taste, em São Paulo

19/11/2018 04h00

Você já parou para pensar em como os humanos definiram quais plantas deveriam ser comidas e quais não? Claro que não estamos falando aqui sobre alimentos venenosos, aqueles que, diz a piada, também são comestíveis, só que apenas uma vez. Mas, sim, como é que se determinou que a alface e a escarola eram verduras que deveriam ser cultivadas e vendidas, mas a capuchinha ou a beldroega não.

Se estes dois nomes não são familiares para você, está tudo bem. Dentro dessa seleção, elas foram categorizadas como PANC: Plantas Alimentícias Não-Convencionais. Talvez você já tenha ouvido algum chef falar ou lido algo sobre isso. Pausa para uma curiosidade linguística: se usa a sigla assim mesmo, sem o “s” para o plural, já que ela em si já representa mais de uma planta. Simplificando o conceito, as PANC são espécies vegetais que não ganharam espaço na produção e comercialização de alimentos em escala. Isso até que algumas pessoas ligadas ao setor da nutrição e alimentação começaram a estudá-las e resgatá-las.

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A capuchinha, por exemplo, é uma flor laranja comestível, uma das mais célebres dentre as PANC. Suas folhas verdes arredondadas são usadas para fazer chás e infusões. A flor em si, que também pode ser amarela, vermelha, rosa e creme, vai bem como ingrediente da salada ou complemento de carnes e queijos.

Já a beldroega é parente da planta onze-horas, tem uma versão ornamental e outra comestível (de folhas mais arredondadas). A hortaliça é uma planta rasteira, normalmente confundida com ervas daninhas, mas mal sabem algumas pessoas: ela pode ser usada em saladas, refogada com vegetais ou ser integrante de uma boa sopa.

O que tem pra hoje?

Taioba na horta de Tanea Romão - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Taioba na horta de Tanea Romão
Imagem: Arquivo pessoal
"Na minha casa, minha avó chamava essas plantas de ‘mato à tôa'", conta a cozinheira e pesquisadora de ingredientes brasileiros Tanea Romão, sempre com um prato com PANC entre as duas escolhas do dia no Kitanda Brasil, restaurante que comanda na sua própria casa em São Paulo (R$ 28 com salada, prato principal e sobremesa nos dias de semana; R$ 32 nos fins de semana).

"Uso o que tem no dia na minha horta ou o que consigo encontrar no Instituto Chão, por isso não tem receita e nem ingrediente fixo. Adoro o umbigo de bananeira e também flores como as de ipê", explica Tanea. Por sinal, o umbigo (ou coração) de bananeira é mais comum de ser encontrado na culinária mineira, geralmente é refogado com alho e cebola nos pratos.

Exatamente por não serem produtos comercializados em larga escala, muitos cozinheiros e chefs fazem o mesmo que Tanea: plantam em sua própria horta o que gostam de usar e mudam o cardápio com frequência. Rodrigo Oliveira é um deles. Ele usa o que estiver disponível na sua pequena plantação como acompanhamento do feijão de corda servido no Mocotó, um dos pratos veganos da casa (versão mini R$ 16,90, pequena R$ 22,90, média R$ 34,90 e grande R$ 47,90).

Feijão de corda, do Mocotó - Ricardo D'Angelo / Divulgação - Ricardo D'Angelo / Divulgação
Feijão de corda, do Mocotó
Imagem: Ricardo D'Angelo / Divulgação
Pode ser ora-pro-nobis (uma planta trepadeira), bertalha (verdura também conhecida como espinafre-indiano) ou major gomes (uma moitinha que cresce espontaneamente em beira de calçadas, também chamada de beldroegão). Todas elas são refogadas e têm sabor suave. Já no Balaio IMS, Oliveira serve um frango guisado acompanhado de caruru (R$ 59), uma PANC de sabor mais amargo.

Na Casa de Ieda, Ieda de Matos e José Carmo usam muito a azedinha no arroz (também chamada de vinagreira, cuxá ou hibisco, é, como o nome diz, ácida) e o feijão andu, uma leguminosa não-convencional comum em praças até das cidades grandes. Eles também estão trabalhando um cardápio especial com as plantas da Chapada Diamantina, região de origem de Ieda, com foco na palma forrageira. "Se usa muito em saladas quentes. Tem o cortado de palma [uma espécie de picadinho com a planta, que é um cacto] e eu já criei o palmuru, um caruru de palma feito com dendê e camarão seco defumado. O fruto da palma também é comestível, conhecido como figo da índia", explica Ieda.

No Tuju, o chef Ivan Ralston colocou no cardápio de primavera preparos com sabugueiro (da qual se faz também um licor doce), azedinha, amaranto roxo (que tem folhas roxas e verdes e flores roxas), ora-pro-nobis, cambuquira (flores e brotos de abóbora), pepino melancia e capuchinha. Também dá para provar receitas com PANC, em São Paulo, no Clandestino, da chef Bel Coelho, no Tordesilhas, da chef Mara Salles, e no Arturito, da chef Paola Carosella. Além deles, tem o bar Quincho, que serve o peixinho da horta frito (R$ 16), uma PANC de folhas cujo formato lembra um peixe, tanto que a planta é chamada de lambari da horta.

Na maioria dos casos os pratos entram no cardápio conforme a disponibilidade das PANC e, por isso, não têm preço ou preparos fixos. Então vale a pena checar antes com os restaurantes o que tá rolando no dia ou na estação. Mas isso é uma coisa boa: o fato dos menus serem mutantes é mais um motivo para você descobrir sabores e preparos novos a cada vez que sair de casa para comer.

"É importante conhecer e divulgar a existência das PANC para que nós aumentemos nosso repertório alimentar e dependamos menos do que nos impõe a indústria alimentícia. É uma questão de independência, liberdade, soberania", diz a nutricionista e referência no assunto, Neide Rigo, que coordena o projeto "Comer É PANC", no Sesc São Paulo. Pois abra sua mente e seu paladar: há muito mais na natureza comestível do que sonha sua vã sacola de feira.

*Preços checados em outubro de 2018.

Vai lá

Arturito 
Rua Artur de Azevedo, 542, Pinheiros
Segunda, das 19h às 23h30. Terças a sexta, das 12h às 15h e das 19h às 23h30; sábados, das 12h30 às 16h das 19h às 23h30 e domingos das 12h30 às 16h
Telefone: (11) 3061-4951

Balaio IMS
Av. Paulista, 2424, Bela Vista.
Terça a sábado, das 12h às 23h. Domingo e feriados, das 12h às 17h.
Telefone: (11) 2842-0123

Clandestino
Rua Medeiros de Albuquerque, 97, Vila Madalena.
Segunda a sexta, das 20h às 23h. Sábado, das 20h à 0h.
Telefone: (11) 93100-7700

Casa de Ieda
Rua Ferreira de Araújo, 841, Pinheiros. 
Terça a sexta, das 12h às 15h. Sábado, das 12h às 16h.
Telefone: (11) 4323-9158

Kitanda Brasil 
Rua Catão, 893, Vila Romana.
Terça a sextas, das 12h às 15h. Sábados e domingo, das 12h30 às 16h (fechado no primeiro domingo do mês).
Telefone: (11) 94288-8007

Mocotó
Av. Nossa Senhora do Loreto, 1100, Vila Medeiros.
Segunda a sextas, das 12h às 23h. Sábado, das 11h30 às 23h. Domingo e feriados, das 11h30 às 17h.
Telefone: (11) 2951-3056

Tordesilhas
Alameda Tietê, 489, Jardins.
Terça a sexta, das 18h à 1h. Sábados, das 12h às 17h e das 19h à 1h. Domingo, das 12h às 17h.
Telefone: (11) 3107-7444

Tuju
Rua Fradique Coutinho, 1248, Pinheiros.
Terça a sexta, das 19h30 às 23h. Sábado, das 13h às 16h e das 19h30 às 23h.
Telefone: (11) 2691-5548

Quincho Cozinha & Coquetelaria 
Rua Mourato Coelho, 1140, Vila Madalena. 
Segunda, das 12h às 15h. Terça a sexta, das 12h às 15h e das 19h à 0h. Sábado, das 12h à 0h.
Telefone: (11) 2597-6048

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